Olá!!!!!
TEREZA CRISTINA
MUELAS, esse é o nome, ou simplesmente TININHA. Mulher forte, decidida,
alegre, divertida, inteligente, advogada, carioca de 57 anos e é claro,
atleta de boliche. Assim como alguns veteranos no esporte, poderia nos
brindar com muitas páginas de “causos”, mas, o tempo foi curto. Quero
deixar aqui registrado minha satisfação em ter tido a oportunidade de
conhecer um pouco dessa pessoa que merece todo nosso respeito. Tininha
fiquei sua fã!!
Lu Pitangueira –
Quando o boliche apareceu em sua vida?
Tininha Muelas –
Apareceu na década de 60, porque os meus pais abriram no Rio de Janeiro
uma casa de boliche. O primeiro se chamava “Meu Boliche”, que era de
“pin-boy” e uns dois anos depois nós abrimos o de “cordinha”, que
era o “King’s Boliche”.
LP – Você já
jogava nessa época?
TM – Eu comecei a
jogar com 16 anos. Na época eu precisei de autorização do Juizado de
Menores para competir. Era um papel enorme, parecia até um jornal
(risos). Inclusive, foi uma época em que nós fazíamos os sapatos para
jogar, os “mocassins”. Colocávamos a sola da “maria mole”, ih faz
tanto tempo, (risos).
LP – Não existia
material adequado?
TM – Nós não tínhamos
conhecimento disso, éramos muito amadores. Começamos a ter conhecimento
de material, quando um italiano, o Salvatori, começou a dar umas
“aulinhas” para a gente. A primeira vez que saí do país foi em 1976
quando fui para o primeiro Torneio das Américas. Que eu me lembre não
ganhei nenhuma medalha, mas foi ótimo, conheci tanta gente! Eu tenho um
problema. Eu não tenho os dois tendões da mão direita, que é a que eu
jogo. Então, Bob foi a pessoa que me convenceu a fazer um “semi-finger”.
Eu era uma jogadora que jogava convencional, com isso eu mudei um pouco o
meu estilo de jogo.
LP – O que
aconteceu com o boliche de sua família?
TM – O King’s
foi inaugurado na década de 70 em uma chuva do mês de janeiro e quem
veio para a inauguração, ficou 5 dias dentro do boliche. Depois de uns
dois anos vendemos. Meu pai é dentista, não tem nada com boliche
(risos). Foi um negócio, e como tudo no Rio de Janeiro é passageiro...
É uma “onda” (risos)! Nós vendemos no auge. O “Meu Boliche” era
uma casa em estilo, lindíssima, toda a mobília dela foi feita dentro de
meu apartamento, tinha um painel que era a Pedra da Gávea, uma coisa
muito linda.
LP – E foi lá
que conheceu algumas pessoas como Walter Costa, por exemplo?
TM – Foi lá que
eles me conheceram (risos). O boliche tinha um slogan que era “o esporte
que fazia amigos”. Então as pessoas se reuniam no boliche. Na
quarta-feira eram sempre as mesmas pessoas. Nós fizemos um segundo andar
e na época poucas mulheres jogavam, achavam que a bola era muito pesada,
que era um esporte bruto. A maioria era de homens. As mulheres iam para o
segundo andar jogar cartas e os maridos ficavam em baixo jogando boliche.
LP – Participa desde quando da Federação
Carioca?
TM – Eu fui a
segunda ou terceira mulher a fazer parte. Minhas primeiras competições
foram com a liga americana.
LP – Por quê?
TM – Ah, não
sei, me chamaram para jogar e eu fui jogando (risos). Tinha a Tete, a Vera
Leal e existia uma liga que era no boliche da Rua Figueiredo Magalhães,
onde todas as mulheres em um dia da semana se encontravam. Começava às 2
horas da tarde, então, eram só esposas do pessoal do consulado e de
empresas americanas. Eu era a única que não falava inglês, mas me dava
muito bem com todas elas, pois eu derrubava os pinos, né? Estava bom.
LP – O boliche já
era um esporte para você?
TM – Quando nós
tínhamos a casa comercial, praticávamos por diversão, não como
esporte. O que aconteceu foi que, nós éramos um “bando”. Participávamos
de torneios fora do país, mas, sem nenhuma autoridade do esporte nacional
saber. Quando houve um torneio na Argentina, que eu não fui, e o comitê
de lá enviou para o nosso comitê daqui, o Conselho Nacional de Esportes
na época, uma carta agradecendo a participação dos brasileiros e eles
nem sabiam!! Como é que vai uma delegação sem a nossa autorização?
Quem são esses? Então, o marido da Milena, o Décio, todos, foram
chamados para explicar. Como é que você sai do país, representando esse
país, sem autorização, sem nada? Esse foi o início, nos registramos na
CBDT - Confederação Brasileira de Desportos Terrestres e fomos reconhecidos. Aí
sim, começamos a pedir autorização para sair do país, ia para Brasília,
autorizava, tinha que dizer quem era, etc. Esses foram os primeiros passos
que tivemos antes da CBBOL e da gente pegar a “diversão”, vamos dizer
assim, e tentar fazer dela um esporte.
LP – E você já
foi, administrativamente falando, alguma coisa na federação?
TM – Bom, da
federação eu já fui. Fui diretora financeira há oito anos atrás da
federação do Rio de Janeiro e até consegui legalizá-la direitinho,
pois, nós tínhamos algumas coisas pendentes. A diretoria que estava na
época foi a primeira que conseguiu um patrocínio da Secretaria de
Esportes, nós tivemos quase setenta mil reais em verbas. Depois
veio a história do Pan, construir a vila olímpica, e nós ficamos sem
verba. Mas, é um trabalho que deve ser feito, deve-se dar continuidade a
isso. Eu acho.
LP – O que está
achando das eliminatórias para o Pan?
TM – Eu acho que
na atual conjuntura, se você obriga 30 ou 40 atletas a viajar várias
vezes em tão pouco tempo, se existe uma obrigação nisso, eles deveriam
dar uma ajuda de custo para a gente! Porque nós trabalhamos, temos
compromissos. No boliche parece que ninguém trabalha. Pode-se perder uma
quarta, uma quinta, uma sexta, uma segunda, e aí como é que fica? Ou
temos “paitrocínio”, “maridocínio” ou nos patrocinamos ou nada
feito?
LP – Hobby?
TM – Eu fui
jogadora de vôlei de praia durante muitos anos. Lamentavelmente não era
o que se tem hoje, muitos patrocínios e etc. Joguei muito pela rede Brasília
na Rua Siqueira Campos. Gosto de cinema, gosto de dançar, gosto de viver!
LP – Seu melhor
momento no esporte?
TM – Quando eu
fui campeã no Egito, em 1998. Nós tínhamos um campeonato mundial em
Amsterdã, e surgiu esse evento no Cairo. Precisava de um homem e uma
mulher para ir. Como era uma semana antes de Amsterdã, o Marco Aurélio
disse: Tininha você não quer ir? Aí eu disse puxa, mais eu vou ter que
perder mais 10 dias de trabalho. E ele: mas você já tem a passagem (nós
tínhamos recebido apoio na passagem). Eu perguntei, e o homem? Com quem
você falou? E ele: com Tiago. E ele vai? Perguntei. Vai, só depende de
você, respondeu Marco Aurélio. Pedi dois dias e fui pensar. Ele me ligou
e eu disse que estava difícil, e ele insistindo, são apenas 250 dólares
a mais, o resto tudo está pago. Aí ele me disse: você já imaginou ver
a ópera Aída com as pirâmides de fundo de cenário? Acabei indo, vi a
ópera e ainda ganhei o campeonato. Fantástico! E depois fui para Amsterdã.
LP – Você é
casada?
TM – Não. Acho
que sou casada com o esporte, porque na época eu viajava para o exterior
pelo menos duas, três vezes por ano, com o grupo, Milena, Walter, Décio.
Minha mãe disse que eu casei com as bolas e com os pinos, ninguém me agüentava
não (risos). Ainda tinha a faculdade. Eu parei três anos de jogar
boliche, por não concordar na época com uma série de coisas. Digo hoje
que eu já fiz muito pelo esporte, acho que sou uma das atletas que mais
conquistas têm fora do país e costumo dizer: não quero que ninguém
goste de mim, mas, que me respeitem! Como pessoa, ser humano e como
atleta. Dizem aí que sou “meio carne de pescoço” ... mas ... risos!!
LP – Qual foi o seu pior momento
no esporte?
TM – Não foi no
esporte. Foi na minha vida. Eu estava em um campeonato brasileiro em São Paulo
e uma irmã minha de criação faleceu e eu tinha que jogar. Saí do jogo
e fui carregar um caixão, foi ruim. Eu não tenho o que dizer do esporte.
Foi um momento em que eu estava praticando o esporte. Fiz bons amigos e
volto a ratificar, boliche é um esporte que faz amigos. Só acho que
determinadas pessoas não estão sabendo lidar com isso. Eu hoje, não
tenho muito tempo para treinar, pois tenho minha vida profissional, mas, não
estou em final de carreira no esporte, estou dentro de minha categoria.
Toda vez que a gente vai para fora do país, trazemos algum título, somos
bi campeões sul americanos, sempre trazemos medalhas, colocamos o nome de
nosso país lá em cima. Isso
que é importante. Eu fui consultada sobre esse brasileiro de sênior, e
minha resposta foi a seguinte: eu não vou ser conivente com a CBBOL que
mais uma vez aos 35 minutos do segundo tempo, mudaram as regras do jogo.
Então, eu hoje, como gosto do esporte, não leio regulamentos, porque eu
sei as regras, vou jogar e gosto muito de rever meus amigos. Eu fiz muitos
amigos dentro do boliche.
LP – Acha as
classificações no ranking corretas?
TM – Acho o
ranking muito “mexido”. Não sei por que. Quem ta lá em baixo, vem
para cima, e vice versa. Não sei por que manipulam tanto esse ranking.
Acho que ranking é o momento, você não tem que ter pontos, “foi tanto
mais um pouquinho”, não. É o que você derrubou de pinos, é aquilo. A
sua realidade é aquela. Agora tem um problema: você pode viajar e eu não.
Como é que eu fico? Olha a injustiça! Nós tivemos alguns casos. Uma
campeã brasileira, nove meses depois foi convocada para um sul americano
ou Pan, eu não sei bem, porque tinha sido campeã brasileira há nove
meses atrás! É preciso saber o momento dela agora, o momento do atleta
agora e não de nove meses atrás!! As regras diziam que o campeão e a
campeã brasileira já tinham vaga garantida para participar da seleção
brasileira no determinado campeonato que não me lembro qual era. Acho
isso um desrespeito com o atleta que está hoje em plena atividade. Eu por
exemplo, esse ano eu participei de todos os eventos, porque me interessa o
sul-americano de sênior. Mas, não sei se vou ser convocada para esse
campeonato, entendeu? Tipo: Torneio das Américas, de repente em Belo Horizonte
vai ser esse! Vou falar de minha amiga Marilda. Adoro-a como pessoa, a
respeito como atleta, mas, não concordo com determinadas coisas. Só
jogou campeonatos em São Paulo, só porque bateu na média 2 ou 3 pontos acima de
mim ... é convocada
para o Torneio das Américas! É esquisito, né? Então para que se tem que
participar de tantos eventos? Eu vou sentar em casa e ficar esperando!
Conclusão: ninguém foi, ninguém foi ... eu disse: tenho interesse e vou!
Lamentavelmente no nosso esporte ainda é assim, se você tem condições
financeiras ... vai. Mas, não adianta apenas ter condições financeiras,
você tem que ter condições como atleta de competir. Não é ir lá para
fora e bater 150, 160 de média. Isso não deveria ser autorizado. É
preciso vestir a camisa de seu país, não é você, não sou eu, é o teu
país que está ali!!
LP – Que
conselhos você daria para quem está começando no esporte?
TM – Eu diria: não
seja confederada, fique em uma Liga
por 1 ou 2 anos, depois se vincule a uma federação e defina o que você
realmente quer. Um exemplo é o filho da Marina Suartz, o Marcelo. Os pais
investiram nele, ele gosta do esporte, então ele tem que ser disciplinado
para aquilo. Não pode ser apenas no “oba, oba”. É preciso ter aulas,
investir em material, levar a sério. É um esporte que só depende de você.
Tem que ter também espírito de grupo, de equipe. É um esporte caro, uma
bola custa 350 dólares, um sapato 200 dólares, luvas uns 80 dólares, e
uma hora de pista no boliche?
LP – Qual a sua
melhor virtude como jogadora?
TM – Respeitar
meu adversário.
LP – Giro ou
pontaria?
TM – Eu não giro
muito bola, acho lindo aquilo. Tem que ter um pouco de giro, de veneno,
mas, tem que ter a pontaria certa. Se precisa passar na tábua 8, é 8,
acertar a seta e por aí vai. Você tem que ter pontaria também.
LP – Quais as suas metas
como atleta?
TM – No momento
eu quero ir ao sul-americano de sênior. E acho que eu também tenho
direito a uma bolsa atleta (risos).
LP – Do que você
precisa para ser feliz?
TM – Tão pouco.
Ter amigos, gente que goste da gente, viver a vida ... muito pouco eu acho.
LP – Qual o
defeito que você detesta em você?
TM – De não ter
“papas na língua”...risos.
LP – O que mais
despreza em uma pessoa?
TM – Falsidade.
LP – Do que você
se arrepende?
TM – De nada. Eu
errei e acertei na vida.
LP – Uma música inesquecível?
TM – Ah, são
tantas. “New York, New York”.
LP – Um filme inesquecível?
TM – Difícil, eu
não vou muito ao cinema, eu gosto muito de filme de ação ...
(pensa,pensa)...difícil
te dizer.
LP – Um livro?
TM – Eu leio
pouco porque o que eu mais faço na minha vida é ler processos ... (risos)
... quando começo a ler um bom livro ... eu durmo... (risos). O
“Pequeno Príncipe” eu acho fantástico.
LP – Herói
preferido na ficção?
TM – Não tenho.
LP – Quem levaria
para uma ilha deserta?
TM – Nossa!!!
Risos. Não, não, não, deixo na imaginação das pessoas (risos).
LP – Quem
deixaria lá para sempre?
TM – Meus
inimigos.
LP – Qual seu
maior medo?
TM – Eu tive uma
criação tão dentro da realidade! Eu não tenho medo da morte, porque eu
acho que a morte tem que acontecer. A única certeza que nós temos, né?
Medo não, mas, eu gostaria que a minha mãe fosse eterna, só isso.
LP – Refeição preferida?
TM – Bife com
batatas fritas.
LP – Uma mulher bonita?
TM – Sofia Loren.
LP – Um homem bonito?
TM – Marlon
Brando.
LP – Uma recordação
da infância?
TM – Minha mãe
costuma dizer que eu vivi minha infância tão intensamente, que eu não
guardei nada dela. Não tive tempo de guardar nada. Casa de campo, muitos
amigos sempre. Não sei te dizer. Minha infância foi ótima.
LP – Perfume?
TM – Miguet de
Bonheur.
LP – Cantor?
TM – Música romântica,
então, Luiz Miguel, Julio Iglesias, Frank Sinatra.
LP – Cantora?
TM – Diana Ross.
LP – Ator?
TM – Raul Cortês
e Gianfrancesco Guarnieri.
LP – Atriz?
TM – Fernando
Montenegro.
LP – Recado?
TM – Para nossos
amigos atletas: ... eu gostaria que eles fossem mais atletas!!
Entrevista
concedida em 05/08/06